No aniversário de 158 anos de Planaltina, celebrado no último sábado, a população até que gostaria de só ter motivos para comemorar. A precariedade no atendimento do Hospital Regional de Planaltina (HRP), em especial na pediatria, no entanto, não condiz com os festejos da data. Não por acaso, na manhã de ontem, moradores, estudantes e representantes do Conselho Tutelar e do Conselho de Saúde organizaram um protesto no centro da cidade.
Por volta das 9h, eles se reuniram no mesmo local onde estava previsto um desfile cívico. O grupo conseguiu ocupar a pista destinada ao evento e fazer o mesmo trajeto, aproveitando para reivindicar a falta de assistência médica na presença de vários políticos. Durante o pequeno percurso, foram bastante aplaudidos pela população.
Em seguida, caminharam até o HRP com cartazes, caixões de papelão e cruzes pretas. Cada uma trazia o nome de uma criança e a idade que ela morreu por negligência do Estado, segundo os organizadores. Ao chegar ao hospital, eles, de mãos dadas, rezaram e fizeram um minuto de silêncio. Com a presença da Polícia Militar, a pista teve que ser fechada para a segurança dos manifestantes, mas, ainda assim, o protesto seguiu pacífico e apartidário até o fim, pouco antes do meio-dia. Tanto a PM quanto os idealizadores da iniciativa não souberam precisar o tamanho do público.
Entre os manifestantes, a conselheira Joana D’arc Fernandes explica como surgiu o movimento. “Faço parte de um grupo de palhaços que visitam crianças internadas em hospitais. Em março deste ano, quando fomos ao HRP, não havia nenhum paciente por falta de médico. Resolvemos agir”, explicou.
Ela acrescenta que a saúde deveria ser prioridade. “O direito dessas crianças está sendo violado. Do início até o meio do ano, 32 vieram a óbito por causa desse descaso. Além disso, outros hospitais ficam sobrecarregados porque os pacientes daqui são encaminhados”, completou.
Presidente do Conselho de Saúde de Planaltina, Paulo Cabral lembra que o problema é antigo. “Ano passado, 42 crianças morreram. Esse número tende a dobrar até o fim de 2017. Sabemos que 92% dos óbitos poderiam ter sido evitados. Certa vez, tivemos sete pediatras para fazer plantão de 24 horas durante 30 dias. Ou seja, é uma situação humanamente impossível. Toda vez que o Estado é negligente, a gente paga com a vida”, lamentou.
A dona de casa Maria Barbosa Ribeiro, 51 anos, mãe de um filho com deficiência, é outra vítima do descaso. “Sempre nos mandam procurar atendimento em outro hospital. Toda vez que venho ao HRP vejo crianças saindo daqui ardendo de febre”, finalizou.
Perda difícil de superar
Com o rosto da irmã de oito meses estampado na camiseta, o estudante Guilherme Rabelo Pereira, 18 anos, marcou presença no ato. Em 2012, ele perdeu a caçula após suposto erro médico. “Ela chegou ao hospital com sintomas de pneumonia. Pouco tempo depois, teve um choque anafilático, provavelmente porque recebeu medicação errada. Outro bebê também veio a óbito pelo mesmo motivo e no mesmo dia”, lembrou.
Emocionado, Guilherme relata o impacto da perda. “Ela era um pedaço de mim. Minha mãe teve dois AVCs em seguida. Hoje, está recuperada, mas jamais voltará a ser como antes, esse trauma vai acompanhá-la até o fim da vida”, afirmou. O estudante critica ainda a demora para a Justiça dar uma resposta. “Não sabemos nem se a médica foi punida. Hoje, estou aqui para evitar que outras famílias passem pelo mesmo drama”, concluiu.
Na entrada da pediatria, a reportagem confirmou a precariedade. Segundo o clínico geral Lucena Filho, pela manhã, dois médicos atendiam pacientes com pulseiras vermelhas e amarelas. Já à tarde e à noite, somente um profissional ficaria responsável pelas emergências. “Há anos a pediatria segue desfalcada. Às vezes, os clínicos gerais assumem o atendimento por falta de pediatra”, declarou.
Manuela Rolim
manuela.rolim@jornaldebrasilia.com.br
Manuela Rolim
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Fonte: www.jornaldebrasilia.com.br
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